quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

"A crise em desdobramento e a relevância de Marx"

Postado por Attman e Kamadon

por István Mészáros



Alguns de vocês talvez tenham estado presentes na nossa reunião de Maio

deste ano neste edifício, quando recordei o que havia dito a Lucien Goldman,

em Paris, poucos meses antes do histórico Maio de 1968 francês. Em contraste

com a perspectiva então prevalecente do "capitalismo organizado", que se

supunha ter deixado para trás com êxito o estágio da "crise do capitalismo"

uma visão fortemente asseverada por Marcuse e nessa época também

partilhada pelo meu querido amigo Lucien Goldman insisti no facto de que, em

comparação com a crise em que estamos realmente a entrar, "a Grande Crise

Económica Mundial de 1929-1933" se parecer com "uma festa no salão de chá

do vigário".

Nas últimas semanas vocês tiveram uma antevisão do que eu tinha em mente.

Mas apenas uma antevisão, porque a crise estrutural do sistema do capital

como um todo, a qual estamos a experimentar na nossa época numa escala de

era, está destinada a ficar consideravelmente pior. Ela tornar-se-á na devida

altura muito mais profunda, no sentido de invadir não apenas o mundo das

finanças globais mais ou menos parasitárias como todos os domínios da nossa

vida social, económica e cultural.

A questão óbvia que devemos agora tratar refere-se à natureza da crise global

em desdobramento e as condições necessárias para a sua solução factível.

A CONFIANÇA E A FALTA DELA

Se tentarem recordar o que foi infindavelmente repetido nas últimas duas

semanas acerca da crise actual, há uma palavra que se destaca, ensombrando

todos os demais diagnósticos apregoados e os remédios correspondentes. Essa

palavra é confiança. Se ganhássemos uma nota de dez libras por cada vez que

esta palavra mágica foi oferecida para consumo público nas últimas duas

semanas em todo o mundo, sem mencionar a sua continuada reafirmação

desde então, estaríamos todos milionários. O nosso único problema seria então

o que fazer com os nossos milhões subitamente adquiridos. Pois nenhum dos

nossos bancos, nem mesmo os nossos bancos nacionalizados recentemente

nacionalizados ao custo considerável de não menos do que dois terços dos

seus activos de capital poderia fornecer a lendária "confiança" necessária ao

depósito ou ao investimento seguro.

Até o nosso primeiro-ministro, Gordon Brown, nos apresentou na semana

passada a frase memorável "Confiança é a coisa mais preciosa". Conheço a

cantiga e provavelmente a maioria de nós também a conhece que nos diz

que: "O amor é a coisa mais preciosa". Mas a confiança no sistema bancário

capitalista ser a coisa mais preciosa?! Tal sugestão é absolutamente perversa!

No entanto, a advocacia deste remédio mágico parece agora ser universal. A

palavra é repetida com tamanha convicção como se a "confiança" pudesse

simplesmente chover do céu ou crescer em grande abundância em árvores

financeiras "capitalistamente" bem adubadas.

Há três dias atrás (a 18 de Outubro) o programa da BBC das manhãs de

domingo o programa Andrew Marr entrevistou um eminente cavalheiro idoso,

Sir Brian Pitman, o qual foi apresentado como o antigo Chefe do negócio

bancário do Lloyd's. Eles não disseram quando ele liderou aquela organização,

mas o modo como falou logo o tornou claro. Pois transpirou através das suas

respostas respeitosamente recebidas que ele deve ter sido o Chefe do Lloyd's

Bank bem antes da Crise Económica Mundial de 1929-33. Consequentemente,

para encorajar os telespectadores, ele apresentou uma grande inovação

conceptual no discurso da confiança ao dizer que as nossas perturbações eram

todas elas devidas a alguma "Super-confiança". E imediatamente demonstrou

também o significado de "Super-confiança", ao afirmar, mais de uma vez

naquela curta entrevista, que não pode haver problemas sérios hoje, porque o

mercado sempre toma conta de tudo, mesmo que por vezes ele vá

inesperadamente muito abaixo. Posteriormente ele sempre sobe outra vez. De

modo que ele também fará isso desta vez, e subirá infalivelmente repetidas

vezes no futuro. A crise actual não deveria ser exagerada, disse ele, porque é

muito menos séria hoje do que a que experimentámos em 1974. Pois em 1974

tivemos uma semana de três dias de trabalho na Grã-Bretanha [ainda que em

nenhum outro lugar] e agora não temos isso. Temos? E quem poderia

argumentar contra aquele facto irrefutável?

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