quarta-feira, 11 de agosto de 2010

"MANIFESTO DO MOVIMENTO AUTOGESTIONÁRIO"

Postado por Attman

parte 1- o caminho da verdadeira revoluçao
**
O Movimento Autogestionário é um movimento político autogerido que busca ser expressão teórica e política do movimento revolucionário do proletariado. Ele não possui interesses próprios, mas pretende tão-somente ser uma forma de expressão dos interesses de classe do proletariado. Em períodos históricos não-revolucionários, a classe revolucionária de nossa época, o proletariado, não consegue forjar uma expressão política e teórica autêntica de proporções quantitativas elevadas; nos períodos revolucionários, o proletariado realiza sua autonomização e se liberta dos seus falsos representantes (partidos, ideologias, etc.), passando a autogerir sua luta e começando a construir a autogestão social. O Movimento Autogestionário busca, em um período não-revolucionário, expressar os interesses históricos do proletariado e colaborar com a sua autonomização e assim inaugurar um período de revolução social.
O capitalismo mundial e o brasileiro caminham para uma rápida deterioração e, embora não devemos subestimar a sua capacidade de prolongar sua vida e adiar suas crises, os próximos anos deverão ser marcados por uma movimentação revolucionária ascendente. O capitalismo realiza um desenvolvimento acelerado das forças produtivas e isto é, ao mesmo tempo, sua maior necessidade e sua principal contradição. O desenvolvimento das forças produtivas aumenta a composição orgânica do capital, ou seja, os gastos com os meios de produção tornam-se cada vez maiores, devido ao valor incorporado neles pela força de trabalho ser cada vez maior. É por isso que nos países capitalistas superdesenvolvidos, com o seu alto grau de desenvolvimento tecnológico, se realiza uma busca incessante de aumento de produtividade, ou seja, de produção de mais-valor relativo. Entretanto, apenas o aumento de produtividade não supera tal contradição, pois a mais-valor relativo produzido também será incorporado nos meios de produção e reforçará, conseqüentemente, a tendência à queda da taxa de lucro médio.

A solução encontrada pelo capitalismo superdesenvolvido é deslocar os investimentos em meios de produção para os bens de consumo ou para a expansão dos serviços. Após a segunda guerra mundial e a destruição em massa das forças produtivas provocadas por ela, aumentou-se a intervenção do estado na economia, mas esta solução vem sendo suplantada pela expansão da produção de meios de consumo e do setor de serviços dominados pela iniciativa privada. Mas a expansão da produção de meios de consumo cria a necessidade de expansão do mercado consumidor. Busca-se, a partir disto, integrar as populações das economias capitalistas subordinadas no circuito de consumo e aumentar a capacidade consumidora das pessoas, tal como na estratégia de diminuir o tempo de vida útil dos produtos e na produção de bens descartáveis.

O capitalismo superdesenvolvido negocia com as economias subordinadas produtos da mais alta qualidade tecnológica, incluindo meios de produção, em troca de matérias-primas e meios de produção menos sofisticados, tal como determinado pela divisão internacional do trabalho. Lembrando que a produção de mais-valor relativo é elevadíssima no capitalismo superdesenvolvido, mas que a composição orgânica do capital também acompanha esta elevação, vemos que estes países para se manterem precisam realizar uma transferência de valor dos países subordinados para os países imperialistas. É no comércio internacional que se dá o grosso da transferência de valor que sustenta as economias imperialistas. As empresas monopolistas transnacionais criadas a partir da necessidade de exportação de capitais são outra fonte de transferência de mais-valor, ao lado da dívida externa, através da remessa de lucros, royalties, etc.

A exportação de capitais continua sendo uma necessidade do capitalismo contemporâneo devido a monopolização crescente da economia. A acumulação de capital dos grupos monopolistas faz com que estes ultrapassem os limites das fronteiras nacionais por causa do barateamento dos custos de produção e da integração de um mercado consumidor maior no circuito do consumo.

As conseqüências disto são múltiplas. A expansão da produção de meios de consumo e dos serviços produz uma burocratização e mercantilização crescente das relações sociais e isto interfere na luta operária. Por um lado, cria-se uma burocratização das próprias organizações criadas para representar a classe operária e, por outro, cria-se uma mercantilização que favorece a corrupção de indivíduos da classe trabalhadora e integra-os na sociedade capitalista. Por conseguinte, esta expansão produz efeitos não só econômicos, mas também políticos e ideológicos. Além disso, há uma deterioração da qualidade de vida (vista não do ponto de vista da ideologia burguesa, ou seja, levando em consideração o índice de consumo ou o nível de renda, mas sim do ponto de vista do bem estar físico e mental e de uma sociabilidade não-repressiva) provocada por isto e também pela destruição ambiental. Se o movimento operário assume uma posição mais moderada, os demais movimentos sociais (das mulheres, negro, ecológico, estudantil, etc.) freqüentemente esboçam uma radicalização, expressando a resposta das massas as novas contradições criadas pelo desenvolvimento capitalista.

Acontece que o capitalismo superdesenvolvido encontra-se no limiar de uma nova grande crise. Esta vem se esboçando e a formação de blocos econômicos é apenas uma resposta a esse despontar da crise. Esta, ao chegar, deve produzir uma nova autonomização da classe operária e abrir espaço para a Revolução Social. A crise do capitalismo de estado russo e a desagregação do bloco do capitalismo estatal também reforça a tendência de desencadeamento de uma crise mundial e, concomitantemente, de uma revolução mundial.

O capitalismo brasileiro vem se reproduzindo de forma subordinada ao capitalismo superdesenvolvido. O desenvolvimento subordinado brasileiro convive com um período de rearticulação da divisão internacional do trabalho que irá mudar apenas a forma como ele servirá de apoio ao desenvolvimento capitalista mundial. O Brasil entrou pela via de desenvolvimento capitalista de forma retardatária e por isso se encontrou em desvantagem e atraso em relação aos países que entraram por esta via anteriormente, o capitalismo retardatário brasileiro encontra-se em dependência em relação ao capitalismo superdesenvolvido devido ao seu atraso tecnológico e sua acumulação incipiente de capital. A sua entrada no mercado mundial ocorreu, desde a época do modo de produção escravista colonial, de forma subordinada e em situação desfavorável na divisão internacional do trabalho. A entrada de capital estrangeiro e a aliança da burguesia brasileira com a burguesia monopolista internacional expressa no estado capitalista brasileiro são os meios responsáveis pela transferência de valor do Brasil para o exterior.

A enorme transferência de mais-valor para o exterior, sob as diversas formas em que isto ocorre, deixa a economia brasileira em uma situação de dificuldades econômicas constantes. Apesar disto, a luta operária no Brasil não consegue atingir um nível elevado. A péssima situação em que se encontram as classes exploradas no Brasil não foram suficientes para o desencadeamento de uma luta de massas que coloque em xeque o modo de produção capitalista.

O estado capitalista busca integrar as massas utilizando como principal suporte a democracia burguesa, que é apresentada como o palco onde se desenrola a luta política. A canalização da luta política rumo a democracia burguesa tem como objetivo desviar as classes exploradas da luta política direta para a luta eleitoral realizada por seus “representantes” - corrompidos e integrados na sociedade capitalista - e reforça, assim, a burocratização e integração das forças políticas na sociedade burguesa. O estado capitalista, juntamente com as outras instituições burguesas, utilizam outros recursos para integrar, corromper e burocratizar as organizações políticas e movimentos sociais.
É nesta situação que devemos encaminhar nossas lutas. As “esquerdas” tradicionais estão integradas na sociedade burguesa e são mais um ponto de apoio para a dominação capitalista. Qual é, nesta situação, o papel do Movimento Autogestionário? Cabe ao Movimento Autogestionário buscar acelerar o processo revolucionário e criar as condições favoráveis para a vitória da classe operária quando explodir uma situação revolucionária. Deve-se, portanto, radicalizar e dar um caráter de classe às lutas políticas na sociedade e, ao mesmo tempo, criar no interior da sociedade capitalista centros de contra-poder que inaugurem uma nova correlação de forças que em uma situação revolucionária sirvam de ponto de apoio para a luta operária.

Esses centros de contra-poder devem ser instaurados em todos os lugares onde se expressam a luta de classes (fábricas, escolas, bairros, etc.), o objetivo da formação desses centros de contra-poder é fortalecer a posição da classe operária em relação ao poder do capital e do estado burguês. Outra tarefa é realizar uma luta constante contra a ideologia dominante. A luta cultural na sociedade capitalista contemporânea torna-se cada vez mais importante e, conseqüentemente, a criação de meios alternativos de produção e reprodução das idéias revolucionárias se torna necessária.

Portanto, a estratégia revolucionária na época atual apresenta como objetivo fundamental o aceleramento do processo revolucionário e a criação de condições favoráveis para a vitória do proletariado com o desencadeamento deste processo. Os meios para se realizar isto é uma intensa luta cultural e a formação de centros de contra-poder no interior da sociedade capitalista. Mas é necessário, além disso, saber articular a estratégia global do movimento operário com as estratégias específicas que devem ser elaboradas para cada um movimento social e local onde se realiza a luta de classes. No atual estágio de desenvolvimento da sociedade brasileira é necessário elaborar estratégias específicas para o movimento camponês, ecológico, negro, das mulheres, estudantil, os movimentos sociais urbanos, etc., e articulá-las com o movimento operário e sua estratégia global.

Estas estratégias específicas e estes movimentos sociais devem se articular com a estratégia global do movimento operário e juntamente com as forças revolucionárias formar um bloco revolucionário. A classe revolucionária de nossa época, o proletariado, juntamente com as classes e frações de classes potencialmente revolucionárias (campesinato, lúmpem-proletariado, etc.), os movimentos sociais(ecológico, negro, das mulheres, estudantil, etc.) e as forças revolucionárias, formam a composição social do bloco revolucionário que se complementa com o projeto político comunista, a autogestão social. Esse bloco revolucionário deve elevar o nível da luta de classes através do enfrentamento com o capital colocando um projeto alternativo de sociedade e radicalizar as lutas sociais, além de formar centros de contra-poder no interior da sociedade capitalista e com isso reforçar a luta operária.

"MANIFESTO DO MOVIMENTO AUTOGESTIONÁRIO"

Postado por Attman

parte 2- o caminho do verdadeiro socialismo







Entretanto, deve-se deixar claro qual é a relação que o Movimento Autogestionário deve ter com as instituições burguesas. O estado capitalista é a principal instituição burguesa e é ele que busca regularizar e controlar (através de leis, repressão, burocratização, etc.)todas as outras instituições existentes na sociedade capitalista. A tese da luta pela conquista do poder de estado é contra-revolucionária, pois o estado burguês segue a dinâmica do modo de produção capitalista, além de ser uma organização burocrática criada com o objetivo de sustentar a dominação burguesa. O estado não é um instrumento neutro que pode ser utilizado por qualquer classe para atender interesses diferentes. Ao contrário, ele é uma instituição burguesa que foi criada para atender os interesses de uma classe específica, a burguesia, e por isto só pode servir aos interesses dela.

Ao recordarmos o princípio básico do movimento comunista: “a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores”, recordamos, ao mesmo tempo, que a libertação do proletariado não pode ser realizada por um grupo de golpistas que assumem o poder do estado burguês e doam a emancipação aos trabalhadores. São estes que, na sua luta direta e cotidiana, construirão uma nova sociedade e as instituições correspondentes a esta, a autogestão social. Isto significa que a luta revolucionária do proletariado não é pela conquista do poder do estado e sim pela sua destruição e pela construção da autogestão social.
O estado busca controlar e regularizar todas as outras instituições sociais para dar-lhes um caráter burguês: as associações, os sindicatos, os partidos políticos, as escolas, etc., e também busca legitimar a sociedade capitalista e a si mesmo através da democracia burguesa. A democracia representativa tem como objetivo não só legitimar a dominação burguesa como também busca canalizar todas as lutas políticas e, assim, anular o seu caráter de classe e revolucionário. A contestação e a luta operária é institucionalizada (através da “representação”, embora tal “institucionalização” seja limitada) e perde seu caráter de classe, legitimando ainda mais a dominação burguesa.

Portanto, a luta contra o estado capitalista é, ao mesmo tempo, uma luta contra a democracia burguesa. Todos os partidos políticos que elegem a democracia burguesa como palco da luta política assumem um caráter burguês, tal como deixa claro os exemplos históricos. O estado capitalista busca integrar os partidos políticos na sociedade burguesa através das regras da democracia representativa inscritas nas leis burguesas que regularizam o sistema parlamentar, o sistema eleitoral e o sistema partidário. Além das condições legais de participação na democracia burguesa, existem as condições determinadas pelas relações de produção capitalistas que colocam a necessidade de utilização do poder econômico, propaganda de massas, etc. A conjugação destes dois fatores coloca a democracia burguesa como o lugar de disputa de frações da classe dominante que serve apenas para legitimar a dominação burguesa.

Por conseguinte, a participação ou não-participação na democracia burguesa deve estar subordinada aos interesses históricos do proletariado. Se, em um determinado momento histórico, a participação puder colaborar com a luta direta dos trabalhadores, ela deve ser realizada. Entretanto, como é raro e difícil a democracia burguesa servir para o desencadeamento da luta operária, a posição da esquerda revolucionária deve ser combatê-la.

Quanto às outras instituições burguesas, elas também devem ser combatidas e algumas (escolas e universidades, por exemplo) devem ser consideradas como palco de luta pela formação de contra-poderes mas sem perder de vista que elas continuarão burguesas, ou seja, a formação de contra-poderes não muda o caráter de classe mas apenas inaugura uma nova correlação de forças no seu interior que destrói sua eficiência e serve de apoio ao combate dos trabalhadores na sociedade burguesa. Isto significa que discordamos da tese reformista que afirma ser possível haver uma “dualidade de poderes” em períodos não-revolucionários. O duplo poder só surge em períodos revolucionários e os contra-poderes formados poderão acelerar o processo revolucionário e com o desenvolvimento de tal processo surgirão poderes alternativos e aí sim surge a dualidade de poderes. A dinâmica das relações de produção capitalistas e a ação do estado burguês impedem a existência de uma dualidade de poderes em períodos não-revolucionários e aderir a tal tese é sucumbir ao reformismo.

A estratégia global do movimento operário tem como ponto fundamental a luta de classes na produção. É no local de produção que se dá a exploração dos operários e a valorização do capital. É no local de produção que se encontra a fonte do dominação do capital e sua negação. As diversas formas de resistência dos trabalhadores nas unidades de produção contra a exploração e a opressão dos métodos capitalistas de trabalho devem ser reforçadas até atingir o seu ponto máximo de radicalidade: a greve de massas. O desencadeamento da greve de massas deve receber o apoio das forças revolucionárias e de todos os movimentos sociais. A greve de massas deve generalizar-se e tornar-se greve nacional e deve radicalizar-se tornando-se greve de ocupação ativa e assim implementar a autogestão nas fábricas, ou seja, a dualidade de poderes. Neste momento, a guerra civil oculta transforma-se em guerra civil aberta e expande-se a formação dos coletivos de autogestão social, os conselhos de fábricas, conselhos de bairros, etc., e com o desencadeamento deste processo revolucionário coloca-se em prática novas relações sociais que são expressão de uma nova sociedade. O fim da guerra civil aberta ocorre quando se generaliza a autogestão e se destrói o poder burguês expresso no estado capitalista. A greve de ocupação ativa, que instaura a autogestão nas fábricas e empresas, inaugura novas relações de produção e a destruição do estado capitalista e isto significa a superação do principal aparelho de reprodução das relações de produção capitalistas e da contra-revolução.
Portanto, a estratégia global do movimento operário é acirrar as lutas nas fábricas e empresas, enquanto os outros movimentos sociais buscam reforçar suas posições em outros locais de lutas sociais, até desencadear a greve de massas, a autogestão e a formação de conselhos revolucionários.


As tarefas do Movimento Autogestionário e de todos os grupos revolucionários, são, no período revolucionário, as seguintes:


- Defender a autonomização da classe operária e combater a burocratização sob quaisquer circunstâncias;
- Incentivar a autogestão e a formação de conselhos revolucionários e combater o estado capitalista e todas as organizações (inclusive os partidos de “esquerda” ou “revolucionários”) burocráticos que queiram dirigi-los;
- Lutar pela coletivização e autogestão dos meios de produção, inclusive no campo, combatendo qualquer proposta “distributivista” ou burocrática;
- Desencadear uma intensa luta por uma revolução cultural visando colaborar com uma produção cultural coerente com as novas relações sociais, combatendo, portanto, o racismo, o sexismo, etc.
- Oferecer apoio ao desencadeamento e vitória do movimento revolucionário em todos os países do mundo.
Com o final do processo revolucionário e com a implantação da autogestão social, o Movimento Autogestionário se auto-extinguirá e a participação dos seus militantes ocorrerá nos coletivos de autogestão social.

MOVIMENTO AUTOGESTIONÁRIO
Goiânia, 30 de março de 1994

"O caminho iuguslavo para o socialismo: titoismo contra toda opressao"

Postado por Attman

IUGUSLAVIA DE JOSIP BROZ TITO CONCILIANDO SOCIALSIMO E LIBERDADE:


O caminho iuguslavo para o socialismo: titoismo contra toda opressao




O titoísmo, conhecido internamente como socialismo autogestionário (socijalističko samoupravljanje emservo-croata), é a tendência do comunismo aplicada por Josip Broz Tito na Iugoslávia durante seu regime, entre 1945 e 1980. O titoísmo ficou conhecido por ser uma forma muito mais "branda" de regime socialista, combinando a economia estatizada com diversas liberdades civis. Embora originalmente o termo tenha sido inventado pelos stalinistas no final dos anos 1940 como sinônimo de socialismo pervertido e deturpação ideológica, os próprios titoístas acabaram por adotá-lo, com certo orgulho, para designar o tipo de socialismo "leve" implantado na Iugoslávia.

Os titoístas iugoslavos se abrigavam na Liga dos Comunistas da Iugoslávia, nome do partido comunista federal daquele país após 1952. A mudança de nome se deu para refletir a intenção de desaparelhar o Estado, no sentido contrário dos demais regimes socialistas do mundo.

Quando ocorreu o rompimento entre a URSS e a Iugoslávia, em 1948, o rótulo de "titoísta" foi aplicado a opositores internos do regime soviético, que passaram a sofrer perseguição. Por outro lado, dissidentes iugoslavos também foram tachados de stalinistas pelo governo de Tito e igualmente reprimidos, especialmente na prisão de Goli Otok. Em 1955, com a União Soviética sob o governo de Nikita Khruschov, os dois países reataram relações cordiais. Mesmo assim, a Iugoslávia nunca aceitou ser membro pleno do Comecon.

Fora do mundo socialista, e principalmente no Terceiro Mundo, o titoísmo exerceu grande admiração e liderança internacional, principalmente por conseguir conciliar justiça social com certo grau de democracia. Na África, sul da Ásia e América Latina, o socialismo iugoslavo persistiu como modelo político-ideológico para diversas correntes e governos. Aliada ao carisma pessoal de Tito, essa liderança ficou consolidada no Movimento Não-Alinhado, principalmente entre as décadas de 1960 e 1970.





O princípio fundamental do titoísmo é o de que o socialismo deve ser atingido de acordo com as condições políticas, culturais, históricas e geográficas particulares de cada país, e não imposto por orientações externas. Isto foi usado para recusar a imposição de diretrizes à Iugoslávia por parte da União Soviética. O Marechal Tito não aceitou a política do Cominform de submeter os partidos comunistas dos países membros à orientação de Moscou e rompeu com ele, fundando o Informbiro, entidade que durou até 1955.

No caso específico iugoslavo, Tito tinha bastante margem moral para esse tipo de manobra, já que durante a Segunda Guerra Mundial a Iugoslávia não foi libertada dos nazistas peloExército Vermelho, como a maior parte do Leste Europeu, mas sim pela resistência armada de combatentes patriotas (partizans) comandados pelo marechal.


Tito procurou manter a Iugoslávia como um país "socialista mas independente" e criou o princípio da autogestão (samoupravljanje, em servo-croata), segundo a qual toda a sociedade deveria ser auto-suficiente pelo próprio trabalho, em todos os níveis: desde uma fábrica até o país inteiro. A Teoria do Trabalho Associado levou a políticas oficiais de fábricas pertencentes aos próprios operários (não apenas gerenciadas por eles) e repartição de lucros entre trabalhadores. Os principais colaboradores de Tito na criação dessas políticas foramMilovan Đilas e Edvard Kardelj. Elas se aproximavam do chamado comunismo de conselhos, enquanto os críticos enxergavam nisso traços de corporativismo.

Outro princípio básico do titoísmo é a convivência harmônica entre as distintas etnias, expressado pelo lema "fraternidade e unidade" (bratstvo i jedinstvo em servo-croata). Ao contrário do que ocorreu na URSS com a russificação das demais nacionalidades (por meio do ensino forçado da língua russa e do predomínio da nação russa sobre os demais povos soviéticos na administração do Estado), na Iugoslávia foi criada uma política obrigatória de pluralidade étnica. Isso era realizado inclusive por políticas de cotas mínimas para cada etnia, inclusive minorias como albaneses, em cargos públicos, escolas e postos de trabalho nas empresas.

O titoísmo também é fortemente laicizante (ou seja, separa a religião dos assuntos de Estado), embora tenha garantido a liberdade de culto. Num país multi-religioso como a Iugoslávia, ortodoxos, católicos e muçulmanos podiam freqüentar suas igrejas e mesquitas, mas a religião não era critério oficial de nenhuma forma. Já Stalin, por outro lado, reprimiu a Igreja Ortodoxa Russa durante décadas, até reaproximar-se dela fortemente durante a Segunda Guerra, em busca de apoio popular.




As bases ideológicas do titoísmo foram organizadas apenas em 1958, no X Congresso da Liga dos Comunistas da Iugoslávia (SKJ, na sigla em servo-croata) em Belgrado, mas já estava em prática desde 13 anos antes. O programa aprovado então, Program Saveza komunista Jugoslavije (também conhecido como Programa de Liubliana), estabelecia a autogestão como elemento basilar da organização econômica e social.

Os titoístas entendiam que nem toda propriedade privada era capitalista: pequenos negócios, pequenas propriedades rurais, comércio familiar e outros, por não terem mais-valia, não precisavam ser expropriados. Além disso, valorizava-se a participação direta dos trabalhadores na produção (e nos ganhos obtidos com ela), e não indireta como ocorria na URSS. O titoísmo, assim, criticava o estatismo exacerbado de Stalin, que gerara comprovadas quedas de produtividade na economia soviética.





Apesar de os soviéticos terem revisto suas posturas sob Nikita Khrushchov, durante o processo de desestalinização, e terem buscado normalizar as relações com os iugoslavos, e ao mesmo tempo obter influência no Movimento Não-Alinhado, a resposta que tiveram nunca chegou a ser entusiasmada, e a União Soviética nunca obteve a saída que desejava para o Mar Mediterrâneo. Ao mesmo tempo, os países não-alinhados fracassaram na tentativa de formar um terceiro bloco na Guerra Fria, especialmente após o racha derivado da crise do petróleo.

As atitudes conservadoras de Leonid Brejnev esfriaram de novo as relações entre os dois países (embora nunca mais degenerando ao nível da época do conflito com Stalin). A Iugoslávia apoiou o dirigente Alexander Dubček da Tchecoslováquia durante a Primavera de Praga de 1968, e cultivou uma relação especial (ainda que incidental) com o excêntrico presidente romeno Nicolae Ceauşescu. O titoísmo espelhava o socialismo de face humana de Dubček, enquanto Ceauşescu atraía simpatias por sua recusa em coadunar com (e participar da) intervenção do Pacto de Varsóvia na Tchecoslováquia, o que brevemente pareceu constituir um casus belli entre a Romênia e os soviéticos. No entanto, Ceauşescu era um membro pitoresco da aliança, já que tirava proveito dos eventos a fim de promover sua política autoritária dentro da própria Romênia. Depois que a Tchecoslováquia foi forçada a obedecer às políticas de Brejnev, a Romênia e a Iugoslávia mantiveram conexões privilegiadas até meados dos anos 1980. Ceauşescu adaptou a parte do titoísmo que fazia referência às "condições particulares de cada país", mas mesclou-a com o nacionalismo romeno e as crenças contrastantes do Juche norte-coreano, enquanto embarcava em uma forma particular de Revolução Cultural. A síntese pode ser mal comparada com desenvolvimentos paralelos do Hoxhismo, e deram a Ceauşescu um apoio forte, talvez impensável, em teóricos do nacional-bolchevismo, como o belga Jean-François Thiriart.

A própria ideologia de Tito se tornou menos clara com as pressões de vários nacionalismos dentro da Iugoslávia e os problemas criados pela Primavera Croata da década de 1970. Entretanto, suas visões econômicas permaneceram firmes, contribuindo para o alto padrão de qualidade de vida gozado pelo país - lentamente, a Iugoslávia se tornou um mercado livrevirtual, claramente separada de outros regimes socialistas no Leste Europeu (e marcada por uma atitude permissiva para com o trabalho sazonal de iugoslavos na Europa Ocidental). Ao mesmo tempo, a liderança pôs termo a tentativas abertas de capitalismo (como a experiência de Stjepan Mesić com privatização em Orahovica), e esmagou a dissidência de pensadores liberais tal como o ex-líder Đilas; também perseguiu tentativas centrífugas, promovendo um patriotismo iugoslavo.

Depois da morte de Tito em 1980, apesar de ainda tida como dogma oficial na Iugoslávia, virtualmente todos os aspectos do titoísmo entraram em declínio acelerado, sendo substituídos por políticas rivais nas repúblicas constituintes. No final da década, com os nacionalismos em ascensão, o titoísmo revisto era nominalmente mantido como ponto de referência por movimentos políticos preteridos pelas tendências majoritárias, como os fóruns cívicos na Bósnia e Herzegovina e na Macedônia. O titoísmo ainda é um tema predominante naiugonostalgia.

A variante socialista da autogestão também foi adotada por um defensor improvável: o pretendente carlista ao trono espanhol Carlos Hugo de Borbón-Parma y Borbón-Busset, fundador do Partido Carlista, nos anos 1970. Entretanto, não atraiu muitos adeptos durante a redemocratização espanhola e vários carlistas preferiam suas tendências conservadoras centenárias.

"Reformas economicas em Cuba: A revoluçao avança rumo ao socialismo pleno

Postado por Attman

Breno Altman *



As medidas anunciadas pelo presidente cubano, em seu discurso de ontem (1/8) diante da Assembléia Nacional do Poder Popular, abrem nova fase na vida do país. Desde sua posse, em 2008, Raúl vinha adotando reformas lentas e graduais, nos marcos do regime socialista. O enunciado de providências mais amplas e detalhadas, porém, parece indicar que esse processo será acelerado.
O núcleo principal do programa apresentado aos deputados é marcado pelo estímulo ao empreendedorismo. Várias atividades comerciais e de serviços, estatizadas desde os anos 60, poderão ser exploradas em caráter privado. O governo já tinha revogado, há alguns meses, o monopólio estatal de cabeleireiros e barbeiros. Dezenas de outros setores deverão ser contemplados pela abertura.


Os dirigentes cubanos rechaçam comparações, mas muitos analistas identificam inspiração das experiências chinesa e, particularmente, vietnamita. O Estado continuará a controlar a maior parte da economia e a regular seu funcionamento, mas novas formas de propriedade serão permitidas e até incentivadas.

Não se trata de uma novidade absoluta. Desde os anos 90, quando a União Soviética desapareceu, o governo cubano adotou legislação para facilitar o investimento internacional, a formação de empresas mistas e até o funcionamento de companhias sob controle estrangeiro. Sem o fluxo de recursos provenientes do antigo campo socialista, a sobrevivência de Cuba passou a depender de seu acesso à poupança externa.

O turismo foi o principal segmento alavancado por essa alteração. Mas a mineração, a biotecnologia e a produção de tabaco e bebidas, entre outros ramos, também puderam se reerguer a partir da associação com o capital além-fronteiras. Depois de ter perdido mais de 30% de seu PIB entre 1990 e 1993, Cuba atravessou os últimos quinze anos com um crescimento médio anual em torno de 5%.

A recuperação econômica permitiu ao país resolver os problemas mais dramáticos de escassez e manter razoavelmente intactos os serviços públicos de educação e saúde, reconhecidos por sua universalidade e qualidade. A vida cotidiana dos cubanos, no entanto, continuou ditada pelo sacrifício pós-soviético: os recursos gerados pela sociedade, em especial as divisas com exportações, pagam as contas da rede social montada pela revolução, mas são insuficientes para a prosperidade dos indivíduos.

Esse cenário conduziu a uma situação de baixa produtividade, salários defasados, informalidade da economia e aumento da corrupção. As relações com Venezuela e Brasil, a partir da conquista de seus governos por partidos de esquerda, ampliaram as oportunidades da ilha caribenha. As enfermidades da economia local, contudo, continuaram praticamente intocadas. O programa reformista de Raúl Castro busca um caminho para enfrentá-las.

Logo que assumiu a presidência convocou a população a discutir nos bairros as deficiências e erros do modelo econômico. Também levantou uma série de proibições, como a de adquirir celulares e eletrodomésticos. Seu feito mais notável, até agora, talvez tenha sido a nova política agrária, permitindo aos camponeses o usufruto das terras, a liberdade comercial e o acesso a equipamentos. A emergência dessa agricultura privada melhorou de forma significativa o abastecimento das cidades.

Aparentemente são dois os objetivos principais de sua estratégia: reduzir fortemente os gastos do Estado e desenvolver um mercado interno através da iniciativa empresarial dos cidadãos. Quase 80% dos cinco milhões de trabalhadores cubanos são servidores públicos. Calcula-se que um milhão não tem função específica ou produtiva. Raúl pretende dispensá-los, oferecendo a contrapartida de emprego em uma empresa autônoma ou de abrir seu próprio negócio.

O enxugamento do Estado, nessa lógica, permitiria a ampliação dos investimentos públicos, hoje consumidos pela própria máquina administrativa. O empreendedorismo impulsionaria tanto o fornecimento de bens e serviços quanto o crescimento do mercado interno e uma maior arrecadação tributária. Medidas mais arrojadas de associação com o capital internacional garantiriam oferta de insumos, além de aumento das exportações e dos investimentos estrangeiros.

Outra questão é o bloqueio imposto pelos Estados Unidos. As reformas buscam atenuar os estragos provocados pelo embargo estabelecido desde 1962. Mas também preparam Cuba para o dia em que findar essa anomalia. Uma economia raquítica e sem perspectiva seria presa fácil dos dólares e valores norte-americanos, com o risco do bloqueio ser trocado por práticas neocoloniais. A revitalização produtiva, aliada à integração com a América Latina, pode vir a ser um escudo indispensável contra esse perigo.

Raúl Castro não parece ver, nessas decisões, contradição de fundo com o socialismo. O presidente dá sinais, cada vez mais claros, de que está convencido da necessidade de modernizar o país para manter os direitos sociais e o próprio sistema. Mesmo reafirmando que a cautela continuará a orientar seu método, lançou um formidável pacote de desafios para a revolução cubana.


* Jornalista e diretor de redação do site Opera Mundi